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RPG de Mesa

Recentemente nosso único membro do dislu que não escreve, o Madz, ocupou a mente durante seu trabalho ouvindo nossas partidas de RPG, que aconteceram no começo do site. Com isso veio aquela chuva de comentários e lembranças de pontos chaves do jogo que criamos, alguns desses momentos baseados em uma aventura fixa e outros completamente do zero. Tendo passado quase dois anos desde esse período, é interessante notar a parte do cérebro que parece ser ativada quando  ouço e recordo esses momentos, e perceber que ela se difere completamente de como me sinto ao lembrar de um videogame que joguei há anos.

Eu nem mesmo era um personagem naquela aventura (embora possam advogar ao meu favor que eu era vários personagens, a maioria deles caipiras do interior por minha falha em representar com diversidade), e a sensação que sinto ao lembrar do invasão da caverna dos goblins ou do campeonato de cartas que ocorreu em Phandalin é a de uma memória quase física. É como lembrar de uma festa em que  fui e fiquei muito chapado, onde as lembranças ficam turvas e você acaba só com um veredicto da experiência, embora tenha certeza de sua presença no evento.

Com videogames, a minha mente faz diferente e acaba me colocando como um mero espectador daquilo que  joguei. Lembrando de qualquer jogo, não me sinto na pele de nenhum personagem e nem responsável pela história que  joguei. É como se minhas ações fossem simplesmente uma descompressão e não uma resolução, mesmo se tiver muita liberdade de escolha ou que minhas escolhas tenham um impacto maior.

Muito disso com certeza tem a ver pelo fato que, em RPGs de mesa, você pode simplesmente não jogar como previsto e acabar gerando uma reação positiva, ou emitindo uma emoção marcante. Em jogos de videogame se você largar o controle ou não concordar com a direção que as coisas estão indo na história você pode simplesmente parar ali e desligar o videogame, mas não existe muita reação além da impressão que essa decisão de não jogar mais causou em você.

Se você está jogando Link’s Awakening, por exemplo, na metade do jogo você começa a perceber o rumo que as coisas estão tomando, e o real teor da sua saga ao buscar instrumentos para acordar um peixe dentro de um ovo. Se você não quer continuar essa aventura de uma forma narrativa, enquanto controla o Link, o único jeito é parar de jogar. Entretanto, se você fosse o Link, poderia falar “Cê tá loca, sua Coruja desgraçada? Eu não vou fazer essa porra não, nem que eu fique preso aqui pra sempre.”, e o simples fato de dizer isso já seria uma história e tanto.

A figura do Mestre acaba servindo para que, no fim das contas, o Link acabe pegando a porra dos oito instrumentos independente do seu compasso moral, mas levando em conta esses desvios de padrão e comportamento, para gerar uma parede que vai se moldando aos limites que os jogadores se mostram dispostos a se confinar. A memória disso acaba sendo de uma plenitude de controle, mesmo tendo-se ciência da existência da parede ou da ocasional forçada do Mestre.

Espero que ninguém veja com essa exposição de percepções uma comparação do que é melhor, ou de qual das duas memórias são mais agradáveis. Até por que nem todo jogo de videogame procura ou deve procurar cercar com mais cuidado os limites do jogador, ou nem mesmo criar uma linha narrativa concreta. Bem como não é todo jogo ou sessão de RPG de mesa que vale liberar todo mundo para fazer o que quiser sem resultados mais punitivos. Pelo contrário: a comparação vem do fato das duas sensações serem claramente tão distintas que não consigo vê-las disputando o mesmo palco. Não importa o quanto você tente emular a sensação de um RPG de mesa em um videogame, e vice-versa, um jamais conseguirá ocupar aquele espaço reservado para o outro dentro da gente.

Dito isso, como o espaço de videogames já é bastante preenchido por mim com frequência, a falta que um RPGzinho está fazendo é grande. Deve ser essa toda a explicação de por que a gente está querendo voltar com o bloco, mesmo sendo uma das coisas menos populares que o dislu já fez. Quem sabe em um futuro breve.

Hynx
Quase 40 anos nas costas e fazendo sitezinho de meninagem na Internet. Só por Deus!

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